SIMBIOSE


Eqüoterapia ajuda deficientes físicos a recuperem o equilíbrio emocional


Em um passado não muito distante, os cavalos eram o principal meio de transporte do homem. Vastos territórios foram desbravados por tropeiros sob o lombo de um eqüino. Fonte de serviço, força e destreza, ainda hoje é possível observar cavalos desempenhando esses papéis. Mas quem poderia supor que um dia eles serviriam como remédio, curando doenças biopsicosociais?
Em Cascavel tem cavalo curando gente por aí. Recuperando pessoas de sérios problemas de equilíbrio físico e emocional, a cumplicidade entre animal e paciente permite o exemplo de uma simbiose perfeita. Uma vida em comum. O cavalo cura o paciente, que em troca, ganha muito mais que carinho e comida. Ganha gratidão e reconhecimento.
Na Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais (APAE) de Cascavel, é possível ver esse trabalho acontecendo todos os dias, pouco depois das 9 da manhã. A chamada Equoterapia é um método terapêutico e educacional que utiliza o cavalo dentro de uma abordagem interdisciplinar, nas áreas de Saúde, Educação e Equitação, buscando o desenvolvimento biológico, social e psicológico de pessoas portadoras de deficiência ou de necessidades especiais. O cavalo é utilizado como recurso terapêutico, ou seja, como instrumento de trabalho. O movimento rítmico, preciso e tridimensional do cavalo, que ao caminhar se desloca para todos os lados, pode ser comparado com a ação da pelve humana no andar, permitindo a todo instante entradas sensoriais profundas, estimulações olfativa, visual e auditiva.
A técnica tem como objetivo proporcionar ao portador de necessidades especiais o desenvolvimento de suas potencialidades, respeitando seus limites e visando sua integração na sociedade, proporcionando ao praticante benefícios físicos, psicológicos, educativos e sociais.
A equoterapia é baseada na prática de atividades eqüestres e técnicas de equitação, sendo um tratamento complementar na recuperação e reeducação motora e mental. Na parte física, o praticante da equoterapia é levado a acompanhar os movimentos do cavalo, tendo que manter o equilíbrio e coordenação para movimentar simultaneamente tronco, braços, ombros, cabeça e o restante do corpo, dentro de seus limites. O movimento tridimensional do cavalo provoca um deslocamento do centro gravitacional do paciente, desenvolvendo o equilíbrio, a normalização do tônus, controle postural, coordenação, redução de espasmos, respiração, e informações proprioceptivas, estimulando não apenas o funcionamento de ângulos articulares, como o de músculos e circulação sangüínea.
Durante toda a sessão os profissonais também ajudam a estimular a autoconfiança, auto-estima, fala, linguagem, estimulação tátil, lateralidade, cor, organização e orientação espacial e temporal, memória, percepção visual e auditiva, direção, análise e síntese, raciocínio, e vários outros aspectos. Geralmente trabalham na eqüoterapia um fisioterapeuta, um fonoaudiólogo e um psicólogo.
Na esfera social, a equoterapia é capaz de diminuir a agressividade, tornar o paciente mais sociável, melhorar sua auto-estima, diminuir antipatias, construir amizades e treinar padrões de comportamento como: ajudar e ser ajudado, encaixar as exigências do próprio indivíduo com as necessidades do grupo, aceitar as próprias limitações e as limitações do outro, facilitando assim a interação do deficiente físico e mental com a sociedade.

UMA HISTÓRIA QUE DEU CERTO
Paulinho, de apenas 7 anos, chega para a sua sessão de equoterapia acompanhado da mãe. Nos olhos, um brilho intraduzível em palavras. No rosto, um largo sorriso, demonstrando a ansiedade e a alegria de estar novamente junto àqueles que auxiliam em seu tratamento. Do outro lado, de um grande cocho sai Filé, fiel parceiro no tratamento de Paulinho. Com toda a dificuldade de um portador de deficiência mental, Paulinho corre ao encontro de seu amigo. Coloca seus assessórios de equitação e monta em Filé. É a relação homem-animal levada ao extremo entre força e carinho para curar vidas.
A equoterapia é altamente recomendável no caso de Paulinho. Ele tem uma alteração genética no cromossomo 16. Os portadores dessa doença possuem os polegares e hálux largos e grandes, associados com anomalias craniofaciais e retardo mental. Infecções respiratórias e cardiopatia congênita também são características.
A doutora Rose Largo, fisioterapeuta da APAE há mais de 17 anos, conduz seus pacientes nessa simbiose. “É uma satisfação enorme poder fazer esse trabalho. Há 15 anos trabalhamos com a equoterapia e já vi muitos pacientes terem melhoras consideráveis depois do tratamento. O Paulinho é um deles. O comportamento e o equilíbrio dele melhoraram consideravelmente. Não tem palavras para dizer como é gratificante poder ajudar essas pessoas”.

O SURGIMENTO DA EQÜOTERAPIA
O uso do cavalo como forma de terapia data de 400 A.C. quando Hipócrates utilizou-se do cavalo para "regenerar a saúde" de seus pacientes. Em 1901 foi fundado o primeiro hospital ortopédico do mundo e em função da guerra dos Boers na África do Sul, o Hospital Ortopédico De Oswentry (Inglaterra) onde o número de feridos era muito grande. Uma dama inglesa, patronesse daquele hospital, resolveu levar os seus cavalos para o hospital a fim de quebrar a monotonia do tratamento dos mutilados. Este é o primeiro registro de uma atividade eqüestre ligada a um hospital.
Liz Hartel (Dinamarca), praticante de equitação foi acometida aos 16 anos por uma forma grave de poliomielite, a ponto de durante muito tempo não ter possibilidade de deslocamento, a não ser em cadeira de rodas e depois, muletas. Mesmo assim, contrariando a todos, continuou a praticar equitação. Oito anos depois, nas Olimpíadas de 1952, foi premiada com a medalha de prata em adestramento, competindo com os melhores cavaleiros do mundo, e o público só percebeu seu estado quando ela teve de apear do cavalo para subir ao pódio e teve de se valer de duas bengalas canadenses. Esta façanha foi repetida 4 anos depois, nas Olimpíadas de Melbourne, em 1956.
No Brasil, a partir dos anos 80, quando foi criada a ANDE-Brasil (Associação Nacional de Eqüoterapia) o tratamento tomou maior impulso, mas somente nos últimos seis anos é que se pode notar o verdadeiro crescimento desta modalidade terapêutica, haja visto o número crescente de centros de eqüoterapia em todo território nacional.
A Equoterapia foi reconhecida como método terapêutico em 1997 pelo Conselho Federal de Medicina.

INDICAÇÕES
A eqüoterapia é indicada no tratamento dos mais diversos tipos de comprometimentos:
Patologias ortopédicas:
Problemas Posturais: cifose, lordose, escoliose;
Doenças do crescimento;
Má formação da coluna;
Acidentes com sequela de fraturas e pós-cirúrgicos;
Amputações;
Artrite Reumatoide;
Artroses;
Espondilite Anquilosante;
Dismorfismos esqueléticos;
Subluxações de ombro ou quadril;
Patologias Neuromusculares (Neuropatias):
Epilepsia Controlada;
Não Controlada (alguns casos);
Poliomielite;
Encefalopatia Crônica da Infânica;
Seqüelas de TCE;
Plegias;
Doença de Parkinson;
Acidente Vascular Cerebral;
Mielomeningocele;
Multiesclerose;
Espinha Bífida;
Lesões medulares;
Hidrocefalia;
Macrocefalia;
Microcefalia;
Patologias cardiovasculares e respiratórias:
Cardiopatias;
Doentes respiratórios (que desejam principalmente se reabilitar voltando a realizar esforço e prática de exercícios físicos).
Outras patologias:
Distúrbios Mentais - demência em geral, Síndrome de Down;
Distúrbios Comportamentais / Sociais - formas psiquiátricas de psicoses infantis e estados marginais, autismo, esquizofrenia, distúrbio da atenção, hiperatividade;
Distúrbios Sensoriais - deficiência visual, deficiência auditiva;
Alterações de Escrita - disgrafia, disortografia, dislexia, distúrbio da percepção;
de Linguagem Oral - alterações de fala, atraso de linguagem;
de Motricidade Oral;
de Voz;
Emocional - insônia, ansiedade, stress;
Atraso Maturativo - do desenvolvimento psicomotor, instabilidades psicomotoras;
Seqüelas de queimaduras;
Doenças sanguíneas;
Doenças metabólicas

CONTRA- INDICAÇÕES
Excessiva lassidão ligamentar das primeiras vértebras cervicais (atlas - axis) ex. Síndrome de Down, Epilepsia não controlada;
Cardiopatias agudas;
Instabilidades da coluna vertebral;
Graves afecções da coluna cervical como hérnia de disco;
Luxações de ombro ou de quadril;
Escoliose em evolução de 30 graus ou mais.
Hidrocefalia c/ válvula;
Processos artríticos em fase aguda;
Úlceras de decúbito na região pélvica ou nos membros inferiores;
Epífises de crescimento em estágio evolutivo;
Doenças da medula com o desaparecimento de sensibilidade dos membros inferiores (todavia, são conhecidos vários casos de paraplégicos que continuam a praticar a equoterapia);
Pacientes com comportamento autodestrutivo ou com medo incoercível;
Hemofílicos e Leucêmicos (dependo do caso).
O futuro praticante de equoterapia deverá passar por uma avaliação clínica, pelo seu próprio médico ou pelo médico da equipe que irá atendê-lo, com a responsabilidade de indicar ou contra-indicar a prática de Equoterapia.
Alguns desses casos podem praticar a equoterapia, porém com um rigoroso controle. Por esse motivo, cada contra-indicação deverá ser discutida caso a caso. Como não se tem o direito de arriscar e agravar a situação do paciente com o pretexto da reeducação, a equoterapia é desaconselhada em todas as doenças na fase aguda e no caso de deficiências graves.

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